sábado, 7 de maio de 2011

Ensinar é para os melhores - Reportagem Revista Veja

Ensinar é para os melhores

Poucas escolas de formação de professores têm a reputação do Instituto Nacional de Educação, em Cingapura – sob o comando de Lee Sing Kong, 57 anos. À faculdade credita-se muito do rápido avanço da educação no país, que partiu de um patamar semelhante ao africano, em 1960, para figurar hoje entre os melhores do mundo em sala de aula. A seguir, os principais trechos da entrevista que Lee Kong concedeu à repórter Camila Pereira.

LÁ, PROFESSOR TEM STATUS  

Só admitimos na escola de formação de professores aqueles estudantes que, no ensino médio, aparecem entre os 30% melhores da turma. A ideia é que os mais talentosos do país sirvam à educação. Não adianta baixar uma regra dessas, no entanto, sem criar incentivos bem concretos para que tais jovens se interessem pela carreira. Um deles é o bom salário inicial, semelhante ao de um engenheiro no mesmo estágio. O outro é o prestígio da profissão em Cingapura. No dia dos professores, o presidente faz questão de receber aqueles que deram contribuições especiais às suas escolas. Os melhores ganham prêmios em dinheiro e são adorados pela população. Tudo isso explica a altíssima procura pela carreira. Em meu instituto, a relação é de seis candidatos para cada vaga – e todos são bons.

A CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO  

Ensinamos apenas técnicas pedagógicas cuja eficácia já foi comprovada cientificamente. Temos dois laboratórios para fazer esse tipo de pesquisa. Num deles, o foco é desenvolver novas metodologias de ensino. No outro, testamos essas ideias na prática. São estudos longos e sistemáticos, que envolvem diferentes grupos de alunos. Ao final do processo, é possível identificar o que dá certo para transmitir cada conhecimento. Munidos dessas pesquisas, passamos a orientar os aspirantes a professor a fazer uso de recursos tecnológicos de modo produtivo. Por exemplo: nossos professores criam situações em que os alunos têm de pesquisar juntos, em rede, na internet. Para despertar a atenção dos estudantes hoje, é crucial entender que eles já nasceram num mundo conectado e pensam de maneira menos linear. São capazes de realizar diversas tarefas ao mesmo tempo e gostam mais de interagir do que de assistir passivamente a uma aula. Por isso, exercícios práticos e atividades em laboratório tornaram-se um dos esteios da nossa educação.

COMO UMA RESIDÊNCIA MÉDICA  

Em nosso currículo, cerca de 30% do cronograma do curso se cumpre dentro das escolas. Os alunos passam por uma espécie de residência médica, em que efetivamente dão aulas, supervisionados por docentes mais experientes. É básico para qualquer um que queira aprender a ensinar, embora ainda não seja assim em muitos lugares. Felizmente, na maioria dos países da OCDE, que engloba os trinta países mais industrializados do planeta, já existe essa compreensão de que a formação do professor deve incluir uma intensa experiência prática. Do contrário, será incompleta.

UMA NAÇÃO QUE FORMA CIENTISTAS 

Despertar o interesse dos alunos por química, física e matemática é visto como função prioritária dos professores em Cingapura, como é na Ásia de modo geral. Ainda no ensino fundamental, os estudantes são incentivados a fazer pesquisas e os que se destacam já começam a trabalhar com pesquisadores renomados dentro das universidades. Há também muitas feiras de ciências ao longo do ano e as populares olimpíadas internacionais. Grandes cientistas costumam se tornar ídolos nacionais. Os prêmios Nobel são recebidos como celebridades em Cingapura. Nessas ocasiões, garantimos que alunos e professores das escolas – e não apenas os universitários – assistam às palestras e os conheçam pessoalmente.

ESCOLAS DIRIGIDAS COMO EMPRESAS  

Em Cingapura, boas ideias do setor privado são aplicadas na educação. Há uma década, as escolas públicas do país definem sua Visão, Missão e Valores – a tríade básica em qualquer empresa. Elas também determinam metas a ser alcançadas e são cobradas pelo governo. Ainda existe uma política de bonificação pelo desempenho. Um professor que obtém bons resultados em sala de aula chega a receber dois salários a mais por ano. Não temos professores ruins. Quem não apresenta bons resultados é demitido.

POR QUE NÃO COPIAR? 

Se não bastasse o fato de que custa caro produzir tanta pesquisa como nós fazemos, ainda existe, em certos lugares, resistência à ideia de que a escolha de métodos pedagógicos deve se basear em evidências científicas. Mas estou certo de que mesmo os países com menos recursos podem ir nessa direção. Basta olhar para o que dá certo e, por que não, copiar. Claro que é preciso tomar cuidado ao adaptar métodos didáticos a realidades culturais diferentes, mas essa solução não deve ser desprezada por países que não têm muito para investir.

Qualidade na educação pública: a contribuição dos gestores

Foto:Dox
Por: Maéve Melo dos Santos[1]

A liberdade de comunicação na maioria dos países, o fortalecimento da democracia e da cidadania no Brasil e a comprovação de que o aumento da escolaridade são garantias para a melhoria das condições de vida da população, provavelmente, aí residem as bases para a atual busca pela qualidade na Educação.
O debate sobre a qualidade não é simples. Existem perspectivas diferentes e até contestações, pois são muitos os segmentos que discursam sobre o assunto. Escolas, faculdades, estudantes, pais, servidores, autoridades locais e centrais defendem perspectivas de qualidade segundo os seus interesses. Embora cada segmento tenha ênfase, propósitos e até definições diferentes para o significado de qualidade em Educação, existe uma grande convergência em entender que a melhoria da qualidade educacional se expressa pela aprendizagem dos conteúdos, pelo ensino e pela otimização das estruturas escolares.
Como a educação se concretiza em cada sala de aula, ressalta-se o papel da gestão escolar. Nesse aspecto, a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação preconizam a democracia e a autonomia como alicerces da administração educacional. Esses avanços, alicerçados nos marcos legais, fortalecem a educação, mas exigem, no mínimo, competência e responsabilidade dos gestores.
É fato e os estudos comprovam que escola eficaz, obrigatoriamente, possui gestão eficiente – que fique bem claro: equipe gestora competente. A gestão administrativa e pedagógica de uma escola impõe que muitas tarefas sejam feitas além dos muros escolares, por isso, a exigência de um grupo competente e unido pela causa é condição para a melhoria da unidade.
Os órgãos centrais de Educação, atualmente, concentram seus esforços no controle da qualidade, através dos mais variados instrumentos de avaliação e do estabelecimento de metas a serem atingidas em cada esfera, nível e tempo educacional. Há que se destacar a importância das avaliações e das metas, sem, no entanto, deixar de reconhecer que cada unidade escolar é quem pode garantir a qualidade. Cabe, aqui, uma distinção útil entre controle e garantia: o controle preocupa-se com o monitoramento do resultado; a garantia concentra-se em avançar sobre os resultados.
Mecanismos de controle externo pouco contribuem para a melhoria interna. São as equipes gestoras, nos seus microcosmos, que deverão desenvolver o próprio gerenciamento da qualidade.
Cabe, entretanto, ao gestor responsável pela escola, apresentar uma lista de qualidades que servirão de exemplos para todos os membros da unidade. Conhecimento, habilidade e capacidade de gerenciar pessoas (e conflitos pessoais) são defendidos pela Unesco – Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura, como pilares educacionais. A autonomia requerida e exigida para a eficiência da escola impõe que o gestor agregue o exemplo e a transparência de suas condutas como paradigma do seu trabalho.
Os cursos de formação, normalmente, não qualificam e/ou instruem os acadêmicos para o trabalho de gestão, daí a obrigatoriedade da busca pessoal pela competência. Reconhecer as suas próprias limitações e, por conseguinte, a necessidade de melhorar, pode ser o primeiro e grande passo para cada uma das pessoas envolvidas na busca pela melhoria da Educação.
É chegada a hora de a educação pública brasileira apresentar-se para a sociedade como algo positivo, eficiente e promotor de melhoria na vida das pessoas, sobretudo as das classes menos favorecidas economicamente. O produto do trabalho docente só se revelará eficaz se for capaz de promover o sucesso dos alunos.
Quem assume a gestão de uma unidade de ensino deve ter o compromisso permanente de continuar estudando e contribuindo com seu esforço e inteligência para que o ambiente escolar possa, além de contribuir com o domínio dos conteúdos inerentes aos processos formativos da intelectualidade, ser um espaço para inclusão comunitária, para o fortalecimento da democracia e para o engrandecimento da nossa cidade e da nossa região.


[1] Professora da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF. Mestranda em Gestão e Avaliação da Educação Pública/UFJF/MG